Durante a minha rápida estadia em Brasília, em março, fiz algumas compras para a viagem. Em primeiro lugar, comprei uma bermuda térmica, baseado na experiência da primeira caminhada que havia feito em Porto Velho, a primeira da preparação para a trilha.
Eu havia decidido a caminhar desde a minha casa até o aeroporto. Coloquei então um short de uma marca de esportes famosa, meus tênis e uma camiseta. No meio do caminho, senti que alguma coisa estava errada na parte interna das minhas coxas, bem em cima, perto da região genital. Não sabia se estava coçando, doendo ou só incomodando mesmo, mas também não quis parar para ver o que era. Quando cheguei em casa e aquele troço me doía uma barbaridade é que fui ver o quanto o safado do short havia me machucado com uma costura mal feita, que foi ralando minhas coxas por quase oito quilômetros. Naquele exato instante, pensei que estrago semelhante durante a trilha poderia me deixar ensangüentado e inutilizado, motivo pelo qual comprei uma caríssima bermuda térmica em Brasília, para colocar por baixo da calça. Custou tão caro, para os meus padrões de pão duro, que comprei só uma. Por que ter outra? Eu usaria cueca por baixo, minha esposa não viajaria comigo e, mau cheiro por mau cheiro, eu já tinha a catinga de urina da mochila, o que seria uma boa desculpa a dar para meu amigo Gustavo. Na pior das hipóteses, pensei comigo mesmo, deixaria a bermuda térmica dormindo do lado de fora da barraca que dividiria com o Gustavo, já que deixá-la de dentro significaria uma sacanagem sem precedentes.
Na mesma loja, comprei duas joelheiras, ou tensores para joelho, conforme recomendado pela agência. Ao longo do tempo, eu saberia se realmente essa compra tinha valido a pena ou não...
Por fim, adquiri na mesma loja um bastão para caminhadas, um Kailash Antishok. Paguei caro no danado, cerca de R$ 85,00. Mas, achei o bastão muito invocado, com diversos tipos de regulagem e um bom sistema de amortecimento. Nunca tinha usado algo assim, mas durante a subida do vulcão Villarrica, no Chile, a machadinha que nos deram auxiliou bastante a manter o equilíbrio, lembrança que me fez, após titubear durante alguns minutos, decidir pela aquisição do bastão.
Quanto ao saco de dormir, decidi alugar da agência mesmo, que já o tinha oferecido. Na minha casa em Porto Velho, qualquer objeto do tamanho de um saco de arroz ou maior que entrasse teria que pedir para outro do mesmo tamanho dar licença e procurar outra morada. Não que a casa fosse minúscula, mas não era suficiente para as tralhas que eu e a minha esposa tínhamos. Além disso, assim como não esperava usar mochila depois do Roraima, também não tinha pretensão de usar sacos de dormir, a menos que meu sonho de conhecer o parque Torres del Paine, no sul do Chile, se concretizasse antes da paternidade. Pelo sim, pelo não, fiquei com o aluguel, até porque o preço de um saco de dormir novo estava pela hora da morte, talvez até mais caro do que um caixão. Minha esposa é que não gostou daquela história, pois na opinião dela saco de dormir seria algo duradouro, que eu poderia guardar muitos anos. Não só isso: o alugado seria nojento, já vindo com mau cheiro e suor de outras pessoas. Argumentos inteligentes e plausíveis, mas que não convenceram o escorpião abrigado no meu bolso.
Interessante que o tal do isolante térmico eu comprei. De início, nem sabia o que era aquele troço. Ao vê-lo, em uma loja de Porto Velho mesmo, entendi: era um pedaço de borracha com forração de alumínio em um dos lados, para ser colocado dentro da barraca e sob o saco de dormir, de maneira a não deixar o frio do chão chegar até o corpo. Achei o troço barato, menos de R$ 40,00, e vi uma finalidade para ele: praticar ioga, pilates, alongamento ou qualquer doidice que eu viesse a inventar depois da trilha. Decisão tomada, mais um item riscado no check list.
Algo que não me chamou muito a atenção na lista da agência foi o tal do chinelo tipo papete. Outra novidade para meu vocabulário, pois nunca tinha ouvido essa palavra. Eu tinha uma boa e velha Havaiana, que subiria a montanha comigo com o maior prazer. Só era um pouquinho pesada, confesso, mas serviria. Pensando nisso, não cogitei em comprar o tal do chinelo, até que entrei em uma loja de calçados e, só por curiosidade, perguntei à vendedora o que era aquele troço que tinham me recomendado. Foi aí que descobri que era um chinelo com uma alça atrás, para prendê-lo um pouco acima do calcanhar, como uma sandália. Achei um que me chamou a atenção, relativamente feio e brega, mas melhor do que os demais por ali. Comprei. Minha esposa achou horroroso e minha compra havia sido por impulso, em desprezo à Havaiana, mas o cartão de crédito já tinha trabalhado e não tinha mais volta. A papete seria outro item que o futuro me diria de sua importância ou da idiotice de levá-la...
Quanto ao cantil, eu tinha dois, todos de plástico, com algum isolamento térmico bem vagabundo, mas presente. Resolvi que os dois iriam comigo até Boa Vista e, lá, eu decidiria quem não participaria da caminhada. Em relação às luvas, já tinha mandado trazer uma velha que ficara em Uberlândia, a qual chegou às minhas mãos junto com a mochila fedorenta. O mesmo aconteceu com a touca. Não sei por qual razão, nem sei como, eu tinha duas delas, do modelo utilizado pelos índios andinos. Coisinha bem feia, confesso, provavelmente comprada como souvenir em alguma das minhas idas à Cordilheira dos Andes, mas que agora seria ressuscitada para o desafio do Monte Roraima.
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